A última entrevista com Jô Caneças
“Ainda tenho esperança, mas às vezes vejo muito o fim do túnel”

Nacional

A VIP publicou aquela que foi a última entrevista a Jô Caneças. A mulher de Álvaro Caneças, que morreu esta segunda-feira, relatava, em fevereiro, a dolorosa batalha contra um cancro

Seg, 04/03/2019 - 18:07

Era carinhosamente tratada por, mas o seu nome é Maria Goreti Guedes. Nasceu na Régua, perdeu a mãe aos 14 anos e cedo veio para Lisboa, mais concretamente para a Amadora, para casa de uma tia paterna. Tirou um curso de bordadeira na Singer e estudou à noite. Na altura, a tia disse-lhe que não ficava bem a uma jovem daquela idade entrar em casa tarde e Jô Caneças acabou por se empregar numa fábrica de malas de senhora, a Peixoto Soares. Era ajudante e ganhava muito pouco. Como aprendeu rápido a profissão, acabou por subir na empresa. Saiu de casa da tia e foi viver sozinha para um quarto. Ideia que não agradou ao pai, que deixou de lhe falar durante um ano. Além desse emprego, Jô também vendia ouro em segunda mão, bordava, enfeitava azulejos com fotografias e vendia.

Foi através de um grupo de amigos que conheceu o marido. Inicialmente, não se mostrou muito interessada, mas após a insistência de Álvaro Caneças, acabou por aceitar que os amigos lhe dessem o seu número de telefone. O mesmo aconteceu ao convite que lhe havia feito para jantar. A partir daí, nunca mais se separaram. Viveram uma história de amor, com altos e baixos.

Jô Caneças sofreu muito por Rita Caneças, a filha mais velha do empresário, não gostar de si, mas com o tempo as duas foram-se aproximando e mantêm uma relação cordial. Com João, o filho mais novo de Álvaro, a relação sempre foi boa.

Há cerca de 14 anos, o empresário deparou-se com um “problema” na próstata. Os médicos disseram-lhe que já não era operável e Jô mudou-se com ele para os Estados Unidos para fazer os tratamentos necessários. Cinco anos depois, os especialistas deram-no como curado, para grande alívio do próprio e da família. Sempre muito unidos, eram o amparo um do outro. 

Jô Caneças, de 66 anos, lutou com todas as forças contra um cancro que inicialmente teve origem no pâncreas e que mais tarde se alastrou para o fígado e para os pulmões. Debilitada, a mulher do empresário Álvaro Caneças falou em exclusivo à VIP sobre esta batalha. 

A nossa revista publica novamente aquela que é a última entrevista de Jô Caneças: 

VIP – Como é que se sente?
Jô Caneças – Tenho estado muito mal, péssima. Hoje tentei comer um puré de sopa e deitei logo tudo fora. Estou deitada e nem tive tempo de ir à casa de banho.

Está a fazer quimioterapia?
Sim, esta é muito dolorosa. São três semanas de quimioterapia. Quando os médicos viram que a minha situação estava pior é que me receitaram esta quimioterapia. No início da semana (dia 4 de fevereiro), quando for à Fundação Champalimaud, se fizer esta quimioterapia, vou tentar pedir… vou ter de ficar internada porque não posso vir para casa. Os médicos já queriam que eu ficasse internada.

Sente-se muito debilitada fisicamente?
Sinto. 

Ainda tem esperança?
Ainda tenho, claro, mas às vezes vejo muito o fim do túnel. Tenho passado umas noites e uns dias horríveis. O meu marido, coitado, também já não aguenta. Ele vai almoçar qualquer coisa e vem logo para casa.

O Álvaro está sempre consigo?
Está, sim. Passa no escritório para assinar alguns papéis e vem logo para casa. Enfim…

Há quanto tempo é que já dura esta batalha?
Depois de o cancro ter sido descoberto, já vou no terceiro ano. Sem melhoras nenhumas.

Mas já houve fases em que esteve melhor?
Tive uma fase, foi um mesinho de férias, no verão. Mais nada!

O cancro está espalhado por que zonas do seu corpo?
O cancro do pâncreas tinha alastrado para o fígado e para o pulmão, mas o problema é que o cancro voltou ao pâncreas e alastrou muito para o fígado, por isso, a opinião dos médicos, há uma semana, era que eu devia ter ficado internada um dia e eles mudavam-me a medicação, que não sei bem o que era, para fazer efeito nos nervos do estômago, porque como o cancro alastrou muito, os nervos aumentaram, e é isso que me dá estas grandes dores. O tratamento que me queriam fazer era exatamente para diminuir essas dores, mas não deu resultado.

Então chegou a fazer esse tratamento?
Sim, fizeram, mas não deu resultado. As dores continuaram.

Qual é o próximo passo?
É continuar a fazer quimioterapia. Fazer novos exames e ver como é que está a situação do cancro do pâncreas, e não sei se eles querem operar-me de novo…

Mas sente-se em condições de se submeter a uma intervenção cirúrgica?
Não, agora acho que ficava na maca na sala de operações. Mas os médicos é que sabem. Eu confio neles.

Como é que a Jô está a viver esta fase da sua vida?
Não posso estar a mentir. Quero mostrar às pessoas que tenho força e quero aconselhar as pessoas a irem à luta, mas sinto-me muito, muito em baixo. Estou cheia de dores, enroscada aqui na cama. Tenho de ter ajuda quase para tudo. Depois, pode ser que melhore… Por exemplo, ontem [dia 28 de janeiro] terminei a quimioterapia que estava a fazer aqui em casa. Foram três semanas. Devia ter melhorado, mas não sei o que é que me deu. Espero que amanhã esteja melhor. Depois tenho de ir fazer análises e na segunda-feira [dia 4 de fevereiro] é que os médicos me vão dizer o que é que vão decidir. O que é que eu posso fazer?… Eles é que vão decidir se tenho de ficar internada. Os médicos quiseram dar-me esta quimioterapia porque foi a única que, para a altura da operação, ajudou a diminuir o tumor e a isolar um pouco os tecidos à volta. Esta, pelos vistos, fez efeito! Mas deixa-me de rastos. É horrível! Não tenho forças para nada, para nada…

Tem de continuar a ter esperança…
Sim, se Deus quiser.

Acredita que os médicos vão encontrar uma solução?
Eles, coitados, fartam-se de me enviar emails com nomes de medicamentos. Eu tomo a medicação que eles mandam, mas depois ainda fico pior. Como também não como nada, o estômago também não aguenta. Tem sido um caos! Por isso é que os médicos querem internar-me, para me orientarem melhor.  

Texto: Carla Vidal Dias; Fotos: Impala e DR
  

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