Luís de Matos fala do acidente que lhe mudou a vida
«Perdi a imortalidade aos 23 anos»

Nacional

Luís de Matos está de volta com o espetáculo Impossível. O mágico conta como é que um acidente de automóvel lhe mudou a vida

Ter, 25/12/2018 - 19:30

A paixão pela magia começou aos nove anos de idade, altura em que Luís de Matos, de 48 anos, fazia parte de um grupo de teatro da escola. “Havia um menino no grupo que fazia magia e eu ganhei uma paixão enorme por esses momentos. Acabei por aprender as primeiras coisas com ele.” A magia tornou-se um hobby que foi alimentando até pedir a exoneração do corpo docente da Escola Superior Agrária de Coimbra, onde tinha tirado o curso de Engenharia Técnica Agrária. Enquanto estudava já estava a fazer programas para a RTP. Depois de terminar o curso, foi convidado para ficar a trabalhar na escola. “Na altura fiquei no conselho de coordenação de Engenharia Agropecuária. Estive assim dois anos. Mas durante esse tempo essas minhas duas vidas ganharam uma dimensão tão grande que tive de escolher”, revela Luís de Matos.

A ambição e a humildade 

Ser mágico em Portugal não é tarefa fácil, que o diga Luís de Matos, o maior mágico português com uma carreira internacional recheada de sucessos e de prémios, dos quais se destaca o Devant Award, que recebeu aos 43 anos e que é considerado um dos mais importantes do Mundo. “A minha carreira é resultado de duas variáveis, claramente antagónicas, ou nem por isso. Uma é a ambição e a outra é a humildade e que estão resumidas neste mapa”, diz enquanto aponta para um mapa-múndi que tem numa das paredes do seu escritório e onde estão assinalados todos os pontos dos vários países onde já fez espetáculos. “Este mapa resume tudo, ambição e humildade. Ambição porque quando estou a criar, a escrever, a pensar e a testar, a mim só me interessa investir trabalho numa coisa que seja igualmente boa em Ansião, em Coimbra, em Portugal ou no Mundo. A minha referência é fazer coisas que, se por ventura, fossem deslocalizadas para outro ponto do Mundo, eram dignas e igualmente bem feitas. A humildade é quando nós sentimos que apesar de sermos capa de uma revista ou jornal, somos importantes é aqui (diz apontado para a zona de Coimbra). Há todo um Mundo para descobrir e existem pessoas tão boas ou melhores do que nós. É fundamental manter a humildade”, assume.

A VIP visitou o Estúdio 33: Uma Caixa Aberta à Porta Fechada, em Ansião, perto de Coimbra, onde está radicada a empresa do mágico. São dez mil metros quadrados, onde o empresário prepara os seus espetáculos, experimenta novos truques e magias, ou seja, é o seu laboratório. Ao todo, a equipa é formada por nove pessoas. “Todos os dias venho para a Disneylândia da minha vida”, diz orgulhosamente.

Luís de Matos está com o espetáculo Impossível, no Tivoli BBVA, em Lisboa, até ao dia 30 de dezembro, onde conta com a participação de Yu Hojin, o campeão do Mundo que foi o rosto visível dos Jogos Olímpicos da Correia, Aaron Crow, que chegou à final do Got Talent, há três anos, os portugueses Tá na Manga, que já ganharam vários prémios internacionais e ainda os Momentum Crew, campeões de dança urbana e break dance. “Este espetáculo traz de novo a visão contemporânea e vanguardista da magia neste momento”, diz e explica porquê: “Quando perguntamos a alguém se gosta de magia, muitas pessoas respondem que nem por isso. E quando pergunto qual foi o último espetáculo a que assistiram, dizem que nunca viram na vida. Isto significa que as pessoas acham que a magia que se faz no século XXI e o patamar artístico em que ela se encontra é semelhante à imagem estereotipada que têm desde que nasceram, de um senhor de cartola que fazia aparecer coelhinhos. Passaram-se ‘séculos’ sobre isto. A magia é a mais antiga das artes performativas. Portanto, o Impossível traz várias carinhas larocas que vêm de várias partes do Mundo, mas que, acima de tudo, representam, cada um deles, uma visão vanguardista, contemporânea e diferente, espetacular, do melhor que se faz neste momento em magia no Mundo inteiro.”

A vida privada

Em janeiro, Luís de Matos vai iniciar uma digressão pela Europa, por 20 capitais, que se estende até junho. As últimas semanas foram passadas a viajar por algumas destas 20 cidades a fazer a promoção do espetáculo. O mágico diz que “não me canso. Divirto-me muito com o que estou a fazer”, explica, mas acrescenta: “não deixo de ter cansaço físico e psicológico, tenho muitas preocupações, mas divirto-me”, diz com um brilhozinho nos olhos. Quando questionado se no meio de tanto trabalho tem tempo para a vida privada, Luís de Matos é perentório: “Claro que sim, mas não esquecendo que no conceito de vida privada, as pessoas muitas das vezes têm de afastar o tempo que passam a trabalhar dessa sua vivência pessoal porque, de facto, não há muito espaço para ela. No meu caso, quando estou a trabalhar também estou a ter vivências pessoais, ou seja, é a minha vida que está em jogo”.

O seu maior inspirador foi Paul Daniels (que faleceu em 2016). “Admirava-o desde os meus nove anos. Era através dos seus programas que tinha contacto com a magia. Claramente que desde os meus nove anos que é o meu ídolo. A nossa história é interessante. Durante as primeiras séries de programas contactei-o várias vezes e fui entrevistá-lo a Londres. Depois convidei-o para participar num programa meu. Anos mais tarde, em 1996, ele foi convidado para vir ao meu programa da RTP e começámos a criar laços de amizade. Depois há um momento de viragem muito interessante, quando eu tenho pela primeira vez uma série de televisão no canal 1 da BBC, ao sábado à noite, e para minha surpresa, quando estava em Coimbra a acompanhar o programa, fui ao Twitter, que é a rede social com mais expressão em Inglaterra, e de repente vejo um comentário do Paul Daniels a falar espetacularmente bem de mim e fazer comentários do tipo: ‘Não percam este mágico, por que ele é espetacular!’ Eu cresci a ver este homem na BBC e ele está no Twitter a dizer que eu sou espetacular! Foi um orgulho enorme. A nossa amizade consolidou-se. É a história de um fã que se torna amigo pessoal do seu ídolo. É extraordinário!”, conta orgulhoso. 

 

“O que vamos fazer em palco é mentira”

Luís de Matos pede às pessoas que quando vão assistir a um espetáculo seu façam como quando vão ao teatro, ou mesmo quando leem um livro, ou quando ouvem uma música. “Abstraiam-se do seu mundo real e assistam. O que nós vamos fazer em palco é mentira. Nós não partimos as mulheres ao meio, mas deixem que desafiemos essa capacidade de sonhar e usufruam ao máximo daquele momento, porque triste seria ir ver o filme A Star is Born (Nasceu uma Estrela) e achar que aquela não é a história verdadeira da Lady Gaga e que eles não estão apaixonados e que ela não passou por aquilo tudo. Isso é pouco importante! O que é importante é usufruir da história.” O mágico aconselha as pessoas que vão ver o seu espetáculo a não estarem o tempo todo a olhar para o palco, a ver como é que a magia se faz, mas sim a deixarem-se envolver e a desfrutar dos momentos.

“Esse acidente foi extraordinário” 

Luís de Matos revela que não acredita que o futuro esteja escrito ou destinado. O mágico refere que “cada coisa que fazemos, tem uma consequência” e revela que ainda lhe falta “fazer tudo. Agora é que eu devia começar! Tenho tantos projetos. Viver é uma coisa extraordinária e receio que muitas pessoas só percebam isso quando já é tarde demais. Eu tive uma sorte enorme. Não fui um visionário. Tive uma coisa espetacular que foi um acidente de automóvel quando tinha 23 anos. Esse acidente foi extraordinário na minha vida, porque quando tinha 18 anos ouvia dizer que a imortalidade perde-se aos 40 anos, quer-se com isto dizer que aos 40 anos percebemos que não vivemos para sempre. Eu perdi a imortalidade aos 23 anos. O carro foi dado como perda total e eu não sofri nada. Foi uma coisa extraordinária porque percebi durante o acidente que podia ter terminado ali, portanto devemos aproveitar da melhor forma a vida, pois para mim, ela passou a ter muito mais valor”, remata.  

Texto: Carla Vidal Dias; Fotos: João Manuel Ribeiro   

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