Io Apolloni
“A selva não é lá, a selva é aqui”

Famosos

A actriz viveu dias complicados na tribo Hamer, mas o balanço é positivo
Embarcou no desafio de Perdidos na Tribo, da TVI, com uma caixa cheia de ervas aromáticas, que no final deixou a Soto, uma das indígenas com quem travou amizade. Depois de tempos áureos como actriz e cantora, hoje, Io Apolloni, de 66 anos, vive da culinária e quis partilhar os seus segredos de cozinha com os Hamer.

Qui, 26/05/2011 - 23:00

 Embarcou no desafio de Perdidos na Tribo, da TVI, com uma caixa cheia de ervas aromáticas, que no final deixou a Soto, uma das indígenas com quem travou amizade. Depois de tempos áureos como actriz e cantora, hoje, Io Apolloni, de 66 anos, vive da culinária e quis partilhar os seus segredos de cozinha com os Hamer. A eterna italiana considera ter-se entendido bastante bem com os etíopes, ao contrário daquilo que aconteceu com o colegaFernando Mendes, com quem diz não ter construído "uma relação produtiva". Um assunto sobre o qual não se alonga, pois é contra polémicas. Por esta e por outras características, diz ter-se identificado com os Hamer.

VIP – O que a surpreendeu mais nos Hamer?
Io Apolloni – É um mundo completamente diferente do nosso. São uma tribo primitiva. São pessoas muito simples, mas com muito carácter. Eu acho que os Hamer funcionam porque têm regras estabelecidas, porque têm disciplina. Aquelas regras têm de ser cumpridas e, por isso, não há rivalidades, não há invejas. Eu acho que a falta destes valores estão a destruir a nossa sociedade e se não mudarmos de rumo descobrimos que a selva não é lá, a selva é aqui.

Veio de lá uma mulher diferente?
Não, apenas com mais certezas. Os Hamer são um povo que vive com imensa serenidade. Nunca os vi discutir e fiquei muito contente por perceber que eles não cultivam o sofrimento. Quando nos viemos embora eu chorei muito e eles cantaram. A Guiana, que era uma das índias que mais convivia connosco, cantava desde manhã cedo.

Nisso é parecida consigo, que também canta sempre que pode.
Verdade, mas eu chorava lá, porque de facto somos assim. Eu sei que nunca seria um Hamer porque a nossa cultura está tão enraizada em nós – eu ainda por cima que sou de duas pátrias – que se torna praticamente impossível apanhar os costumes deles.

Sentiu que era mais fácil habituar-se aos costumes deles precisamente por já ter deixado Itália para vir para Portugal?
Acho que a idade, a maturidade e a sabedoria têm mais importância neste caso. Mas curiosamente, eu nasci numa aldeia, perto de Perugia, logo a seguir à Segunda Guerra Mundial. Quer dizer, não posso dizer que tenha passado fome, mas havia privações na altura. Digamos que não sou uma menina da cidade. As recordações ou as raízes nunca se esquecem. Nesse sentido senti-me bem e muito à vontade com os Hamer porque sei que eles são boas pessoas e eu tenho o mesmo espírito que eles.

Que espírito é esse?
O espírito Hamer é o da solidariedade, do convívio, da família, da lealdade, da honra. São valores que tenho, por isso, identifiquei-me bastante com eles.

Consegue estabelecer algum ponto de comparação entre a sua infância, na pequena aldeia depois da Segunda Guerra Mundial, com o modo de vida dos Hamer?
Claro, nós também íamos fazer chichi ao campo. Isso a mim, por exemplo, não me custou nada.

O que lhe custou mais?
Eu estive com eles sempre com grande respeito e quando não conseguia cumprir as tarefas que me davam, até mesmo quando fui castigada, não foi por falta de respeito que não as fiz. Essa história de beber o sangue ou de pôr a cabeça dentro do estômago da cabra foram coisas que me custaram. Mas tudo tinha sempre uma razão de ser.

Qual foi a razão para pôr a cabeça dentro do estômago da cabra?
Depois de me terem dito que eu tinha de transportar a lenha às costas por uma encosta acima eu pensei para comigo: "O que é que eu estou a fazer?" Eu tenho quatro hérnias discais e estava a pôr em perigo a minha saúde. Quando cheguei ao fim da tarefa, porque a quis fazer até ao fim, desatei a chorar de dor e expliquei à produção que – até devido à minha idade – aquela era uma tarefa que eu não devia ter feito. Foi por causa das dores nas costas que eles me fizeram pôr a cabeça dentro do estômago da cabra porque aquilo está cheio de enzimas, de sais minerais, vitaminas, etc. e ao respirar faria-me bem. Não foi um capricho nem uma maldade.

Todos dizem que passaram fome. Sendo doceira, a comida foi aquilo de que sentiu mais falta?
Eu quando fui para lá dizia: "Como é que eu vou fazer sem o meu cafezinho?" Mas não senti falta nenhuma. Senti sim, muita falta de tomar banho. Foi uma coisa que me custou muito, porque não há nada melhor do que a sensação de nos sentirmos limpas. Curiosamente, nós não cheirávamos mal, nada disso. Aliás, os Hamer não cheiram mal porque a alimentação deles é à base de sorgo, água e mel, portanto aquilo é tudo descontaminado. Nem o estrume da vaca cheira mal.

Sentiu-se feliz durante os tempos que esteve lá?
Sentia-me bastante bem quando estava com os Hamer, apesar de não conseguirmos comunicar bem. Apenas o fazíamos por gestos. Estive lá de corpo e alma e nunca pensei desistir. Também não tive saudades de nada, porque estava lá e não há motivos para ter sofrimentos inúteis.

Se fosse hoje, sabendo o que sabe, aceitava o convite?
Nunca tive a menor dúvida em aceitar o convite e só tenho de agradecer à TVI ou a quem se lembrou de mim. Eu fui completamente "às escuras", mas o meu lado aventureiro falou mais alto. Hoje não voltaria aos Hamer, mas a outra tribo sim.

Esperava que fosse uma experiência tão dura?
Não encontrei justificação para passarmos tanta fome, mas vejo o lado positivo porque emagreci quatro quilos sem gastar dinheiro nenhum. Aliás, vou aproveitar para tentar perder mais quatro quilos. Eu sou uma pessoa muito positiva e vejo sempre o lado bom das coisas. Houve um companheiro meu que passou a vida a blasfemar sobre não ter comida, sobre ter fome, mas nunca percebeu que felizmente para ele emagreceu oito quilos. É uma maneira de ver as coisas.

Como foi estar lá com pessoas que não conhecia?
Sim, de facto não os conhecia. Se não fossem educados, bem formados, a convivência podia ser problemática. O Kapinha é muito educado, muito divertido, com uma grande fantasia. Com a Cláudia [Jacques] foi muito simples, porque somos as duas mulheres, ela tem um discurso muito articulado, defende muito bem as suas posições e quando perdia as estribeiras dizia uns palavrões e eu fartava-me de rir porque ela nunca diz asneiras.

Não falou do Fernando Mendes.
Prefiro não falar.

Porquê?
Não vou alimentar polémicas. Cada um tem o direito de se dar bem ou mal e a nossa não foi uma relação produtiva.

Escreveu-se que estariam a pensar processar a Quatro Cabezas. A Io é uma dessas pessoas?
Não. Mas a verdade é que nós fomos os parentes pobres dos espanhóis. Nós soubemos que os espanhóis no ano passado, depois de estarem na tribo, tiveram direito a estarem dois dias no SPA; nós não. Depois ainda tivemos de fazer a viagem de regresso de jipe. Além disso, pusemos o nosso guarda-roupa à disposição da produção e a roupa veio toda estragada. Por causa do ocre. Não há salvação possível para essa roupa.

A produção vai cobrir esses estragos?
Não sei, não tenho ideia, mas processá-los nunca me passou pela cabeça.

Já recebeu o cachet?
Já passei a factura. Estou à espera. Não tenho a menor dúvida de que me vão pagar.

Entrou nisto pelo dinheiro?
Não, foi pela experiência.

Anda arredada da TV. Espera que esta participação lhe abra portas?
Sim, claro. A minha carreira está feita, agora só gostava de colher um pouco os louros. Sinto-me com mais maturidade artística.

Texto: Sónia Salgueiro Silva; Fotos: Bruno Peres; Produção: Nucha; Cabelos e maquilhagem: Tita Costa com produtos Maybelline e LÓréal Professionel  

Siga a Revista VIP no Instagram