Helena Sacadura Cabral
“O Paulo Portas deve estar a pagar os pecados da família”

Famosos

Crítica em relação ao Governo em que o filho é ministro, Helena Sacadura
Cabral dedica-lhe o livro ‘O Amor É Difícil’

Qui, 06/06/2013 - 23:00

"O Amor É Difícil.” É assim que Helena Sacadura Cabral define o sentimento mais bonito do mundo. Apesar disso, não se queixa da sua sorte e diz ser uma pessoa muito feliz, apesar de ter perdido há um ano o filho Miguel, vítima de um cancro no pulmão, e de ver o filho Paulo num Governo cujas medidas não respeita. Uma conversa onde a escritora fala sobre o novo livro e onde faz um balanço dos seus 79 anos de vida.

VIP – É fácil escrever sobre amor?
Helena Sacadura Cabral – Sim, porque amor é basicamente aquilo que nos move. Podemos inventar, dizer que é o trabalho, mas atrás está sempre uma forma de amor.

Escrever é fácil, mas amar é difícil?
Eu considero que amar é o mais difícil dos sentimentos. Levar a bom termo um amor é muito difícil. Primeiro, as pessoas têm de fazer uma coisa a que não estão habituadas, que é separar o que é essencial do acessório. E isto é complicado, porque as pessoas confundem muito as duas coisas.

Como?
Pessoas que têm ideologias políticas diferentes e que fazem disso um cavalo de batalha. A forma como se pensa a vida é importante, mas não é vital. Julgo que a maior dificuldade neste sentimento que se chama amor é a tolerância.

A Helena tem esse exemplo em casa…
Eu tive de conviver com dois filhos que pensavam de maneira diferente um do outro e de maneira diferente da minha.

Como se gere uma situação familiar destas?
Eu preocupo-me muito pouco com o que os outros pensam a meu respeito. E o que os meus filhos pensavam de mim não era um problema sobre o qual eu pensasse. Aliás, nenhum dos dois sabia bem o que eu pensava, apesar de nós falarmos muito. Tínhamos, sobretudo, uma convivência inteligente, com diálogos vivos, com muito humor, muita estima uns pelos outros. Como deve calcular, agora passo uma situação muito mais difícil e não me vou matar por isso.

Curiosamente, já se expressou publicamente contra medidas do Governo de Paulo Portas. Enquanto mãe fala com ele sobre isso?
Era o que me faltava! Se eu quisesse estar na política estava e não mandava recados pelos meus filhos. Não é um assunto tabu, mas acho que não tenho nada que lhe dar opiniões.

Mas, como mãe, não fala com ele? Não lhe puxa as orelhas, por exemplo?
Não distingo a mãe da cidadã. O meu filho é um adulto e, como tal, não meto o bedelho. Eu escrevo o que penso e não o deixo de fazer por ter um filho no Governo. Se não gostar, paciência!

Pela educação que lhes deu, sente-se responsável pelas ideologias que seguiram?
Eles são filhos de mãe e de pai. Acho que os eduquei de acordo com aquilo que tinha capacidade. Eu pensava de forma diferente do pai deles e, por isso, transmitimos coisas muito diferentes.

Uma das poucas coisas que se sabe da sua vida pessoal é que se divorciou. Tomar essa decisão fez de si uma mulher diferente?
Fez-me mais mulher. Descobri muitas coisas sobre mim. É uma coisa fraturante, traumatizante, mas não é necessariamente negativo. Mau é continuar um casamento quando não se quer lá estar.

Diz, no início do livro, que a nossa obrigação é sermos felizes. É uma pessoa feliz?
Há pessoas para quem a felicidade é uma coisa muito complicada e, logo, a maneira de a atingir também é complicada. Para mim, a felicidade não é uma coisa objetiva. É um conjunto de situações que me transportam para um sentimento de bem-estar comigo própria. É um somatório de pequenos instantes. O balanço que faço da minha vida é extremamente positivo. Não tenho vocação para o martírio. Ninguém na minha família tem esse espírito, tirando o meu filho, Paulo, que está com uma vocação para o sofrimento enorme. Só pode ser por vocação para o sofrimento, não pode ser por mais nada (risos). Deve estar a pagar os pecados todos da família, coitadinho!

O sentido de humor que tem é o segredo para a felicidade?
É uma das componentes. Sobretudo, ter sentido de humor sobre mim própria. Não nos podemos levar muito a sério.

Escreve que não se arrepende de nada do que fez no passado, mas que não voltava lá.
Não voltava a fazer nada, nem mudava nada. Estou muito contente com a vida que tive, tenho pena das coisas que foram menos boas – como perder um filho –, mas não vejo vantagem em voltar a ter 20 anos.

Gosta mais da Helena de hoje?
Completamente. Eu digo que comecei a viver aos 50 anos. Até lá, andei a aprender. A partir dos 50, a mulher tem uma bagagem que lhe permite dizer o que gosta e o que não quer.

Hoje o que é que quer da vida?
Não ter doenças complicadas, ter a sabedoria de não cair naquela fase de decrepitude de pensar que hoje tenho 50. Quero a objetividade de não ser uma tontinha, de não vestir saias por cima do joelho, ou de me começar a plastificar toda. Gosto muito das minhas rugas,.

Diz que primeiro temos de gostar de nós?
Sim e eu gosto imenso de mim. Acho que as pessoas quando pesam a sua felicidade não têm em conta as outras realidades. Eu perdi um filho… Podia ter perdido dois.

Com a morte aprende-se a relativizar tudo.
Depois de se passar por um choque muito grande, uma pessoa quase que tem vergonha de se queixar do que quer que seja.

Foi por isso que pareceu reagir tão bem à morte do Miguel?
Uma semana depois dele morrer eu estava na Feira do Livro a assinar livros. Há um momento para chorar os mortos – que, no meu caso, foi muito demorado, pelas razões óbvias, o Miguel levou oito dias a morrer… – e, depois, há que cuidar dos vivos. Debruçar-me sobre a dor o que é que iria fazer? Não me ia trazer o meu filho de volta, possivelmente faltaria ao apoio ao Paulo e ao resto da minha família. Há coisas irreversíveis na vida, em que a única solução é andar para a frente.

Texto: Sónia Salgueiro Silva; Fotos: Paulo Lopes; Produção: Manuel Medeiro

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