Victor Hugo Cardinali
“O circo vive da paixão”

Famosos

Acredita que 2015 vai ser um ano mais feliz para os artistas circenses

Sex, 02/01/2015 - 0:00

É o senhor circo em Portugal. Victor Hugo Cardinali, mentor do Circo Cardinali – que abriu portas em 1987 e que, por estes dias, faz as delícias de miúdos e graúdos –, leva esta vida desde os nove anos de idade. Uma vida incerta e de sacrifício. Confessa que este foi um mau ano, no qual não sentiu a retoma económica, e queixa­-se que o público pagante apenas se lembra do circo no Natal. Mesmo assim, tem uma atitude positiva e acredita que 2015 será melhor a nível financeiro. É que, em matéria de gargalhadas, o saldo é sempre positivo.  
 
VIP – A chegarmos ao fim de 2014, que balanço faz deste ano de atividade?
Victor Hugo Cardinali – Este foi um ano mau. A dita retoma económica é só para alguns. É só para os ricos que retomam o que era dos pobres. Desde muito cedo que aprendi que temos de viver com aquilo que temos. As pessoas não vêm regularmente ao circo durante o ano inteiro porque, durante todo o ano, elas próprias fazem circo em casa para conseguirem viver, fazem contorcionismo para pagar as contas. O circo vive de alturas esporádicas, como o Natal. Nesse aspeto, a adesão do público tem sido semelhante à do ano passado.
 
Apesar de tudo, espera que o próximo ano seja melhor?
Nós temos sempre essa expectativa. Temos de pensar de forma positiva. Há muitas alturas em que o que ganhamos no Natal serve para combater as dificuldades do ano inteiro.
 
O espetáculo é diferente no Natal?
No sentido em que no Natal posso pôr todos os artistas que quero a trabalhar no circo, sim. Durante o ano, não consigo ter o investimento que faço em Lisboa, nesta altura. O circo vive do público pagante e da garra e da paixão das pessoas que trabalham cá. A verdade é que, de cada vez que as coisas correm pior, nós reinventamo­-nos e lutamos com mais afinco. Fazemos das tripas coração.
 
Porque o circo é uma paixão?
Sim. E, sobretudo, porque não há Natal sem circo. O problema é que as pessoas deviam lembrar­-se de que o circo existe o ano inteiro, não apenas nesta época. Ninguém liga ao circo no resto do ano. Nem a Imprensa. E nós temos de sobreviver sem apoios, sem subsídios.
 
Por que razão é o circo tão procurado na época natalícia?
Porque é um espetáculo de família. É um espetáculo para as crianças, que querem ver os palhaços, e para os avós, que vêm aqui e têm recordações do que já viveram.
 
Começou nesta vida aos nove anos. Que recordações guarda do circo de antigamente?
O circo, naquela altura, era muito decadente e eu fiz os possíveis para alterar isso. Fiz do circo um espetáculo digno, uma arte.
 
Sente que o seu nome vai ficar associado para sempre a este mundo? Isso é um orgulho para si?
Claro que sim. Mas ainda tenho mais orgulho no facto de ter conseguido passar a minha paixão à minha família. Já passei o meu legado aos meus filhos e agora estamos a transmiti­-lo aos meus netos. É uma vida de sacrifício, ao sol ou à chuva, e eles já o sabem.
 
A continuação do Circo Cardinali está, então, assegurada?
Sim, acredito que sim. 
 
E sendo que os artistas circenses ajudam tantos a comemorar o Natal, será que eles próprios o conseguem fazer? Como é a vossa Consoada?
Não fazemos espetáculos no dia 24. Não trabalhamos. Juntamos toda a família circense, montamos uma mesa no circo e jantamos todos juntos na Consoada.     
 
O que há de novo no espetáculo este ano?
Este ano, tirando os números com os animais, é tudo novo. Está muito bom, o circo.
 
O ano passado, a GNR apreendeu nove leões do circo Victor Hugo Cardinali por estes não terem registo, ao abrigo da convenção sobre comércio internacional de animais selvagens. Este ano, mudou alguma coisa em relação aos animais com quais trabalham?
A questão, aqui, é que existe uma proteção aos animais que não quer que existam animais nenhuns no circo. Está tudo louco neste País. Este ano não chegaram a tanto, mas houve quem requeresse que não fosse montado em Lisboa nenhum circo que tivesse animais. Nós vivemos num país democrático, onde as pessoas são livres de escolher o que querem e o que não querem ver. Portanto, não me parece lógico que exista este tipo de fanatismo. Qualquer dia, isto assemelha­-se ao estado islâmico. Se nós deixássemos de ter animais no circo, sabe o que acontecia? O circo paga­-se dos espetadores pagantes. Logo, sem animais, não haveria o público que os vai ver. Sem público, não haveria dinheiro. Sem dinheiro, eu não teria condições para ter os animais e, aí sim, eles poderiam ser mal tratados. Os ativistas da proteção animal nunca se lembram disto. 
 
Apesar destas questões, e da falta de dinheiro e financiamento, fazer este espetáculo continua a pôr­-lhe um sorriso no rosto?
Sempre, e a ideia é que melhores dias virão. 
  
Texto: Sónia Salgueiro Silva; Fotos: Marco Fonseca
 

Siga a Revista VIP no Instagram