Gracindo Júnior
“É um orgulho ver os meus filhos serem atores”

Famosos

Ator brasileiro está em Portugal e com os seus descendentes leva à cena uma peça que homenageia o pai, PAULO GRACINDO, que faria cem anos.

Qua, 04/04/2012 - 23:00

 Os portugueses conhecem-no de novelas como O Bem Amado, Mandala ou O Salvador da Pátria e agora vão ter a oportunidade de o ver também no teatro, numa peça em que homenageia o pai, Paulo Gracindo, que morreu há 15 anos e e que se fosse vivo faria agora cem anos. O ator brasileiro Gracindo Júnior escolheu a Póvoa de Lanhoso para iniciar uma digressão de cerca de um mês por Portugal com o seu novo espetáculo. Canastrões é uma aventura poética em que a emoção é transformada num instrumento precioso para tocar a alma dos espectadores. Consigo trouxe os filhos, Daniela, Gabriel e Pedro (de 36, 33 e 26 anos) todos eles também ligados ao teatro, cinema a televisão e que consigo formam o elenco da peça. Só ficou a faltar o neto, João, de dez anos, que também já representa, fazendo assim com que esta família já vá na quarta geração de atores.

VIP – Por que escolheu Portugal e a Póvoa de Lanhoso para montar e estrear Canastrões, o espetáculo de homenagem ao centenário do nascimento do seu pai?
Paulo Gracindo – Foi uma sugestão do diretor artístico do Centro de Criatividade – Póvoa de Lanhoso, com a qual concordámos de imediato. Portugal era a paixão do meu pai. Ele tinha uma ligação muito grande aos atores portugueses que em 1930 iam em digressões ao Brasil com frequência e nunca esqueceu também a forma como era aqui recebido a partir da altura em que fez a novela Gabriela. Uma vez, ao passar por Alfama, foi aplaudido por uma multidão.

O Gracindo Júnior já veio cá duas vezes. O que leva de mais importante?
O sentimento de uma raça. Tenho uma identificação muito grande com este país e acho que o outro lugar do mundo em que moraria, além do Brasil, seria aqui.

Já fez rádio, cinema, teatro e televisão. Em qual destes meios se sente melhor?
No teatro, apesar de ser mal remunerado. Foi no teatro que fiz a minha aprendizagem e no meu caso foi um ofício passado de pai para filho. O ator de cinema e de televisão é hoje muito diferente, o seu conceito é outro. É um conceito do ator rico, famoso, hollywoodiano, com presença assídua nas revistas sociais. Mas o meu meio, o meu chão, foi sempre o teatro. Foi aí que comecei a produzir e a dirigir e consegui viver do teatro durante todos estes anos. O cinema é quase uma consequência do meu trabalho como ator de palco.

O facto de ser filho de um grande ator facilitou a sua ascensão na carreira?
Não facilitou em nada, porque o meu pai nunca quis que eu fosse ator. Naquela época, os atores queriam que os seus filhos fossem médicos, engenheiros, pessoas que pudessem ter uma vida comum, com um salário fixo, que lhes permitisse pagar o colégio dos filhos quando os tivessem.

A sua carreira começou aos 14 anos, a trabalhar na rádio, e fê-lo às escondidas do seu pai…
A rádio era a televisão da época e houve muitos artistas que começaram aí. Foi a partir da rádio que comecei a fazer teatro. Claro que com aquela idade e sendo filho de um ator muito famoso, era visto como “o filho do Paulo Gracindo” e tornava-se difícil conseguir impor o meu nome. Isso só aconteceu muito mais tarde, quando o público se habituou a tratar-me definitivamente por Gracindo Júnior ou Gracindinho e me tornei uma pessoa realmente diferenciada. Hoje sou muito respeitado pelo meu trabalho, mas essa herança é muito forte e orgulho-me dela.

O que agradece mais ao seu pai?
A disciplina e o trabalho. São a dignidade do ator. Ele era de uma época em que o ator e o marginal se confundiam. O ator não fazia parte da sociedade, não tinha prestígio, era alguém colocado à margem e até a carteira profissional das atrizes tinha lá escrito: prostituta. O trabalho que o meu pai fez no sentido de respeitar e fazer respeitar a sua profissão veio conferir à classe a dignidade que até então não tinha. Acho que foi essa a grande herança que ele deixou.

E os seus filhos, todos atores, também sentiram esse “peso” da herança?
Foi tudo completamente diferente. Respeitamos muito aquilo que uns e os outros fazemos e há outro tipo de educação. O meu pai era um educador que tinha herdado do meu avô – um alagoano com regras muito rígidas, que o obrigava a levantar-se às cinco da manhã e lhe colocava na frente um quilo de livros para estudar – essa mesma rigidez de atitudes e princípios. Era um grande sacrifício ser um jovem nessa época, mas os meus filhos não passaram por essas dificuldades, cresceram a ver teatro e a comemorar comigo. Tanto que todos eles são atores.

Chegaram um dia junto a si e disseram: “Pai, quero ser ator”?
Não. Foi tudo acontecendo naturalmente. Por exemplo, o Pedro, aos seis anos, já fazia leitura de peças comigo e participou num filme que fiz. A Daniela, por sua vez, é filha de uma grande atriz brasileira, a Débora Duarte e sentiu também, desde menina, uma grande atração pelo palco e muito especialmente pela televisão. Hoje está mais ligada à produção e ao cinema, dá aulas e trabalha comigo na Gracindo Filmes.

Sente muito orgulho nos seus filhos?
Muito. É muito bom, porque são meus companheiros. A melhor forma que tive de comunicar com o meu pai, foi trabalhar com ele. Estar com ele naquilo em que tinha o maior prazer da vida, que era o seu trabalho. Herdei isso dele e o meu prazer é o trabalho. Assim, quando trago a família para o meu trabalho, ele ganha um maior significado. Consigo fazer tudo quando tenho a família junto de mim. Sem ela não conseguiria.

É habitual trabalhar com os seus filhos?
Não posso dizer que seja habitual, mas já fizemos muitas coisas juntos. Há muitos projetos que fizemos e vamos fazer juntos. A família tem tido um papel muito importante na minha vida. Dá-me uma paz e uma estrutura de que necessito e aprecio muito. Gosto que nos juntemos para almoçar, jantar ou apenas para conversar.

Os filhos pedem-lhe muitos conselhos?
Não os pedem nem eu os dou.
Pedro – A aprendizagem é constante e natural. Não só por ser meu pai, como por ser um ator mais velho, há um grande respeito e fomos aprendendo com a experiência diária e com a observação atenta.

O seu neto, João, de dez anos, também já entrou no mundo da representação. Está assegurada a continuidade desta família de atores?
Parece-me que sim. Tenho um grande prazer em gostarmos todos do nosso ofício e de ver essa continuidade. Essa é a maior demonstração do prazer de ser ator. Esta continuidade faz-me gostar cada vez mais do meu pai.

Que género de avô é?
Sou um avô “babado” e muito diferente para com o João do que fui para com os filhos. Com ele sou menos rígido e exigente.

O que gosta de fazer com ele?
Não posso estar com ele como gostava, porque tenho o tempo muito ocupado. Assim, ou nos juntamos no trabalho ou quando vai a minha casa.

E o Gracindo, para além do trabalho o que gosta de fazer?
Tenho uma pequena pousada num local parecido com a Póvoa de Lanhoso e gosto muito de passar lá algum tempo, em contacto com a terra e com a parte rural. O meu avô nordestino tinha uma fazenda de cana e eu ia muito para lá. A minha infância foi praticamente toda passada em fazendas e isso influenciou-me para adquirir essa pequena pousada no meio do mato. Quando posso vou para lá, trabalhar na terra e cuidar dos cavalos.

Qual foi o maior capital que acumulou durante os seus 53 anos de carreira?
Hoje sou um ator que vive confortavelmente. Passei a vida toda a lutar pelo meu sustento. Costumo dizer que o ator não tem férias, fica desempregado e eu, infelizmente, tinha muitas “férias”. Hoje não. Tenho um contrato com a TV Record há quase seis anos, e isso é confortável. Não vim a Portugal com o intuito de ganhar dinheiro, vim para ganhar prestígio. Vim realizar um trabalho com uma dimensão que não podia ganhar no Brasil. Mas o grande capital que tenho hoje é o orgulho de ser ator, o orgulho na minha profissão e ver os meus filhos seguirem-na. A honra de ser seguido é, agora, o meu grande capital.

Aos 68 anos de idade o que ainda lhe falta fazer?
Estou a fazer. O que me falta é continuar a fazer. O meu pai tinha uma frase que repetimos na peça, que é: “Representei na vida e vivi no palco.” Acho que o palco é exatamente onde estou vivo e para continuar a viver tenho de estar a representar. O meu objetivo é realizar sempre um trabalho da dimensão deste que estou a fazer aqui.

Texto: Teixeira Lopes; Fotos: Rui Costa; Produção: Nucha; Cabelo e maquilhagem: Ana Coelho com produtos Maybelline e L´Oréal Professionel

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